Censura: O nome real da nossa liberdade de expressão
Posso não concordar com nada do que você diz mas lutarei até a morte pelo seu direito de dizê-lo.
- Voltaire, poeta francês -
Temos vários exemplo no cotidiano que demonstram os sutis limites da nossa liberdade: o diálogo das novelas e programas de tv que são bem puritanos, evitando palavrões e comentários com humor duvidoso; uma pesquisa rápida pelo mundo dos dubladores (veja um exemplo em hyperlink, logo abaixo) mostra a dificuldade que é adaptar um diálogo americano para os padrões da liberdade de expressão tupiniquim.
Quero demonstrar meu ponto com algumas polêmicas que consigo lembrar de cabeça:
i. O episódio Blame It on Lisa dos Simpsons (abril/2002) retrata uma visita da família mais famosa da tv americana as terras brasileiras. Em seu passeio pelo Rio de Janeiro o humor ácido e politicamente incorreto, marca registrada do desenho, está sempre presente. Essas viagens internacionais acontecem pelo menos uma vez por temporada, já tendo antes caricaturizado países como o Japão, Austrália e França, entre outros. A diferença é que no Brasil rolou um tremendo estresse, virando pauta do governo em reunião no planalto. Pouco tempo depois um novo episódio dos Simpsons, intitulado A Esposa Aquática, foi censurado na dublagem - o diálogo de Lisa e Bart foi alterado, como podemos conferir no site da Globo.com -. Se isso fosse feito nos EUA, por exemplo, não sobraria um único episódio, já que toda a trama da série é movido pelas alfinetadas de Homer, Marge, Bart, Lisa e Meg.
ii. Quem tem boa memória lembra do escândalo que a modelo e apresentadora da MTV Daniela Cicarelli fez quando um filme seu foi distribuído pela internet mostrando o rala e rola dela com o namorado em uma praia pública. Em todo o mundo (principalmente nos EUA) existem vários sites dedicados a divulgar fotos e vídeos dos famosos em cenas íntimas, seja um decote mais ousado, uma cruzada de pernas menos cuidadosa ou mesmo um filme caseiro mostrando o que rola entre quatro paredes. Tudo isso é normal, mas no Brasil o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo bloqueou o acesso ao site YouTube, um dos maiores sites de streaming de vídeo do mundo (matéria da Folha aqui). Pode foder em público, mas olhar num pode. Pouco tempo depois a decisão foi revogada (dah!).
iii. Em Um Brasileiro em Berlim, do escritor baiano João Ubaldo Ribeiro (recomendo a todos, um livro leve recheado de bom humor), são relatados acontecimentos da vida do autor enquanto vivia em Berlim. Embora considerado um liberal pelos europeus por vir de um país onde tudo é permitido, o escritor ficou chocado com várias cenas, como mulheres fazendo topless em plena rua numa tarde de verão - enquanto isso no Brasil várias banhistas foram ameaçadas de prisão por cometer o sacrilégio de fazer topless na praia (veja matéria da Terra Turismo aqui para maiores detalhes) -.
iv. A mais nova onda de censura foi a proibição do jogo Counter-Strike (ou CS). O jogo de tiro em primeira pessoa (ou FPS, First Person Shooter em inglês), lançado em novembro de 2000, foi o maior sucesso dos últimos anos entre os jogos de sua categoria. Agora, se você quer saber o porque disso, vamos aos fatos. O jogo está a mais de 7 anos no mercado, sendo criado como um MOD (MOD é o nome dado para jogos criados a partir de outro) de Half-Life. Nele, policiais e terroristas lutam para defender seu território e para atingir determinados objetivos em mapas que reproduzem um leque variado de lugares dos EUA e de outros países. Tudo ia muito bem até que um mapa, chamado cs_rio, foi criado em 2002 por fãs brasileiros do jogo. Nele os dois times são levados a uma favela do Rio de Janeiro, o que segundo os meios oficiais, denigre a imagem da cidade. Com a declaração oficial de que o jogo "traz imanente estímulos à subversão da ordem social, atentando contra o estado democrático e de direito e contra a segurança pública, impondo sua proibição e retirada do mercado", tanto o Counter-Strike quanto o jogo Everquest foram banidos (foi proibida a comercialização de livros, encartes, revistas ou CD-Rom contendo os jogos) no dia 17 de janeiro desse ano - detalhe: o jogo Everquest é medieval, portanto seguindo a linha de raciocínio teremos de retirar do mercado o livro Senhor dos Anéis, pois os humanos e os elfos foram subversivos ao poder maior da Terra Média, Sauron! -.
Outros jogos ja foram proibidos no Brasil: Carmagedon, Postal III, Grand Theft Auto. O caso do CS é mais gritante pelo tempo que ele tem de mercado. Mesmo não concordando com a temática de muitos jogos que estão no mercado (o que não é o caso do Counter0Strike, que joguei por vários anos), acho que cada um de nós tem o discernimento necessário para escolher o que é o melhor. Ah, tem um adendo: o Brasil já pratica uma política de classificação etária, onde o CS estava como proibido para menores de 18 anos! Mesmo assim, resolveram tirar do mercado.
Apesar disso a polêmica envolvendo o jogo apenas serviu para atrair a atenção dos jogadores que ja haviam aderido a outros games. O jogo foi promovido inclusive na Campus Party, mesmo depois da proibição.
Depois de tudo isso eu pergunto: temos realmente liberdade de expressão? Podemos escolher o que é melhor ou pior para nós? Ou devemos ser direcionados por grupos de minorias que acreditam saber o que é melhor para nós e muitas vezes para seus próprios bolsos?
Liberdade, ainda que tardia.
HYPERLINK
Wiki: Censura aqui
Wiki: Voltaire, pensador francês aqui
Wiki: Conuter-Strike, história e derrota nas mãos da censura aqui
Podcast do Jovem Nerd com o dublador Guilherme Briggs aqui
Matéria da Folha de São Paulo comentando o polêmico episódio Blame It on Lisa aqui
Estadão: Counter Strike no Campus Party aqui
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